SEGUNDA CIRCULAR – XX CAPÍTULO GERAL ENRAIZADOS NO CARISMA

Reflexão sobre o carisma guanelliano.

A nossa identidade baseia-se no carisma recebido...

O carisma sobre o qual se baseia a nossa identidade mais profunda é o dom que o Espírito Santo concedeu a Pe. Guanella ‘para revelar ao mundo que Deus providencia aos seus filhos com solícito cuidado de Pai tornando-o ardente de caridade e enviando-o a consolar as misérias humanas’ (Const. N.11).
Este dom é transmitido para nós: ‘A nós também o Espírito participa a graça e a inspiração evangélica do Fundador, para prosseguir na Igreja o seu ministério de caridade’ (Const. N. 2).
Este dom constitui o nosso próprio nome, define o ideal a ser alcançado, abraçando todos os aspectos da nossa existência.
Sendo um dom deve ser sempre vivido e partilhado com quem leva o nosso nome ‘guanellianos’ . Este cria vínculos mais fortes daqueles da carne e do sangue. E deve ser vivido para os outros, por que não está em função da perfeição própria ou da Congregação, mas foi dado a Pe. Guanella para a Igreja universal e para o mundo (1Cor 1,7).
Com o carisma que temos recebido o guanelliano sublinha um aspecto particular da realidade divina, a paternidade de Deus por isto, iluminados desta relação pessoal com Deus encontramos as motivações e a força para ir ao encontro do próximo com a missão de levar sempre esta imagem de Deus.

Vamos à aplicação:

1.) O carisma é o nome com o qual Deus me chamou à vida e deu-me como caminho a ser realizado a minha felicidade e a minha vocação no mundo,

§§§ Que profundidade alcançou em cada um de nós esta identidade?...
§§§ Quais são hoje, nas nossas Comunidades, os sinais de fraqueza da nossa identidade carismática e do sentido de pertença?
§§§ Quais são as suas sugestões para reforçar na Congregação a nossa identidade carismática?

2.) O carisma antes de ser dom que nos habilita para o apostolado, é uma experiência interior que deve crescer com a oração pessoal e comunitária para que possa transformar-nos sempre mais em filhos do Pai, em Jesus Cristo.
§§§ Em quais maneiras a nossa oração expressa a nossa identidade carismática?
§§§ Quais as sugestões, em nível de Congregação, para dar maior destaque na nossa vida espiritual ao dom do carisma recebido? (Nos números 29-37 da nossa Constituição estão algumas prioridades a serem dadas à nossa espiritualidade para que maiormente corresponda ao carisma recebido).

3.) O carisma nos confia um exato ministério apostólico, fruto da iluminação do Espírito Santo, que, ‘faz-nos partícipes do mandato de Jesus, recebido do Pai, de anunciar aos pobres a alegre mensagem da salvação’ (Const. 61)...E concretamente ‘àqueles irmãos que, em situação de fragilidade e de abandono, como o paralítico do Evangelho, gemem: Senhor, não tenho ninguém!’ (Const. 64) especificando nos números seguintes quem são os destinatários privilegiados...
A dimensão apostólica guanelliana se torna um elemento importante para avaliar a nossa fidelidade à originária inspiração carismática. Aqui a nossa reflexão se amplifica abraçando o tema das Obras e das Atividades com as quais concretizamos o carisma, e que dependem das mudança da sociedade, por isso devem ser atualizadas permanentemente e ‘enculturadas’ com criatividade, mas sempre em fidelidade à essência do carisma.

§§§ A partir da realidade e da experiência da própria Comunidade e Província ( ou Delegação), qual reflexão podemos apresentar para tornar mais significativo o carisma no nosso apostolado caritativo?
§§§ Somos suficientemente satisfeitos da transmissão do carisma no apostolado nas Paróquias e nas nossas Casas, dando suficientemente ‘Pão e Senhor’?.. respeitando as opções religiosas de cada um...?
§§§ Os leigos que atuam conosco são suficientemente ajudados a viver o seu trabalho como vocação e segundo o espírito guanelliano? Quais foram até agora as melhores experiências?
§§§ Obras tradicionais e novas pobrezas…Quais propostas? Quais novos impulsos podemos dar?

4.) O carisma dá forma específica também às nossas relações: entre nós coirmãos, para com os destinatários da nossa missão e em geral com as pessoas com as quais realizamos a nossa vocação. O espírito de família e o sistema preventivo fazem parte do nosso património carismático. ‘O carácter, ou seja o distintivo dos Servos da Caridade na ordem espiritual, religiosa, deve ser um espírito de muita tolerância, um espírito de amplas visões, mais aberto à misericórdia que a justiça’.

§§§ Algumas sugestões para melhorar o nosso espírito de família nas nossas Comunidades, em relação à Família Guanelliana e aos nossos destinatários.

5.) O carisma também na economia

O n. 144 da nossa Constituição que introduz o breve Capítulo sobre a administração dos bens resume os nossos mais importantes valores carismáticos que se referem à economia como meio necessário para ‘ fazer um pouco de bem’.
Apresento algumas indicações tomadas do Papa Francisco no Simpósio organizado pela Congregação dos religiosos sobre o tema da economia.

§§§ Podemos ler e sublinhar alguns pontos que particularmente pensamos que sejam importantes para nós, de maneira que possamos viver este aspecto em conformidade ao nosso espírito. (Cfr Anexo n. 1).

ANEXO 1: MENSAGEM DO PAPA FRANCISCO  
Em fidelidade ao carisma repensar a economia

 Prezados irmãos e irmãs
Agradeço-vos a vossa disponibilidade de vos encontrar para refletir e rezar sobre uma temática tão vital para a vida consagrada, como é a gestão financeira das vossas obras. Estou grato à Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica pela preparação deste segundo simpósio; e ao dirigir-me a vós, deixo-me orientar pelas palavras que compõem o título do vosso encontro: carisma, fidelidade, repensar a economia.
Carisma
Na Igreja, os carismas não representam algo estático e rígido, não são «peças de museu». Pelo contrário, são rios de água viva (cf. Jo 7, 37-39) que escorrem no terreno da história para a irrigar e para fazer germinar sementes de Bem. Em determinados momentos, com a cumplicidade de uma certa saudade estéril, podemos ser tentados a fazer «arqueologia carismática». Não aconteça que cedamos a esta tentação! O carisma é sempre uma realidade viva e exatamente por esta razão é chamado a frutificar, como nos indica a parábola das moedas de ouro que o rei confia aos seus servos (cf. Lc 19, 11-26), para se desenvolver na fidelidade criativa, como a Igreja nos recorda incessantemente (cf. João Paulo II, Exortação Apostólica pós-sinodal Vita consecrata, 37).
Por sua natureza, a vida consagrada é sinal e profecia do reino de Deus. Por conseguinte, não pode faltar esta dupla caratecrística em nenhuma das suas formas, contanto que nós consagrados permaneçamos vigilantes e atentos a perscrutar os horizontes da nossa vida e do momento atual. Esta atitude faz com que os carismas, oferecidos pelo Senhor à sua Igreja através dos nossos fundadores e fundadoras, se mantenham vitais e possam corresponder às situações concretas dos lugares e dos tempos em que somos chamados a compartilhar e a testemunhar a beleza da sequela Christi.
Falar de carisma significa falar de dom, de gratuitidade e de graça; quer dizer mover-se numa área de significado iluminada pela raiz charis. Bem sei que para muitos que trabalham no campo da economia estas palavras parecem irrelevantes, e devem ser relegadas para a esfera particular e religiosa. No entanto, inclusive entre os economistas, já se sabe que uma sociedade sem charis não pode funcionar bem e acaba por se desumanizar a si mesma. A economia e a sua gestão nunca são ética e antropologicamente neutras. Ou concorrem para construir relações de justiça e de solidariedade, ou geram situações de exclusão e até de rejeição.
Como consagrados, somos chamados a tornar-nos profecia a partir da nossa vida animada pela charis, pela lógica do dom e pela gratuitidade; somos chamados a criar fraternidade, comunhão e solidariedade para com os mais pobres e necessitados. Como bem recordava o Papa Bento XVI, se quisermos ser verdadeiramente humanos, devemos «dar espaço ao princípio da gratuitidade como expressão de fraternidade» (Carta Encíclica Caritas in veritate, 34).
Contudo, a lógica evangélica do dom exige que haja também uma atitude interior de abertura à realidade e de escuta de Deus que nela nos fala. Devemos perguntar se estamos dispostos a «sujar as mãos», trabalhando na história de hoje; se os nossos olhos sabem perscrutar os sinais do reino de Deus nos meandros das vicissitudes, certamente complexas e contrastantes, mas que Deus quer abençoar e salvar; se somos verdadeiramente companheiros de caminho dos homens e das mulheres da nossa época, particularmente de todos aqueles que jazem feridos ao longo das nossas estradas, porque com eles partilhamos as expetativas, os temores, as esperanças e também aquilo que recebemos, e que pertence a todos; se nos deixamos dominar pela lógica diabólica do lucro (o diabo muitas vezes entra pela carteira ou pelo cartão de crédito); e se nos defendemos daquilo que não entendemos evitando-o, ou então sabemos permanecer dentro da situação em virtude da promessa do Senhor, com o seu olhar de benevolência e com as suas vísceras de misericórdia, tornando-nos bons samaritanos para os pobres e os excluídos.
Ler as interrogações para lhes dar uma resposta, ouvir o pranto para consolar, reconhecer as injustiças para compartilhar também a nossa economia, discernir as inseguranças para oferecer a paz, enfrentar os temores para tranquilizar: eis as diversas facetas do tesouro poliédrico que é a vida consagrada. Aceitando que não temos todas as respostas e, às vezes, devemos estar em silêncio, talvez também nós incertos, mas nunca sem esperança.
Fidelidade
Sermos fiéis significa interrogar-nos sobre o que hoje, nesta situação, o Senhor nos pede para ser e para fazer. Sermos fiéis compromete-nos num assíduo esforço de discernimento a fim de que as obras, coerentes com os carismas, continuem a ser instrumentos eficazes para fazer com que a ternura de Deus alcance numerosas pessoas.
As próprias obras, das quais se ocupa este congresso, não constituem apenas um meio para assegurar a sustentabilidade do instituto, mas pertencem à fecundidade do carisma. Isto exige que nos perguntemos se as nossas obras manifestam ou não o carisma que nós professamos, se correspondem ou não à missão que nos foi confiada pela Igreja. O principal critério de avaliação das obras não é a sua rentabilidade, mas se correspondem ao carisma e à missão que o instituto está chamado a cumprir.
Ser fiel ao carisma requer muitas vezes um gesto de coragem: não se trata de vender tudo, nem de alienar todas as obras, mas de fazer um discernimento sério, mantendo o olhar bem orientado para Cristo, ou ouvidos atentos à sua Palavra e à voz dos pobres. Deste modo, as nossas obras podem, ao mesmo tempo, ser frutuosas para o caminho do instituto, manifestando a predileção de Deus pelos pobres.
Repensar a economia
Tudo isto comporta o repensamento da economia, através de uma leitura atenta da Palavra de Deus e da história. Ouvir o sussurro de Deus e o grito dos pobres, dos pobres de sempre e dos novos pobres; compreender o que o Senhor pede hoje e, depois de o ter entendido, agir com aquela confiança intrépida na Providência do Pai (cf. Mt 6, 19 ss.), que tiveram os nossos fundadores e fundadoras. Em certos casos, o discernimento poderá sugerir que se mantenha viva uma obra que produz perdas — prestando muita atenção a fim de que estas não sejam geradas pela incapacidade nem pela inabilidade — mas restitui a dignidade a pessoas vítimas do descarte, débeis e frágeis: os nascituros, os mais pobres, os idosos doentes, os portadores de deficiências graves. É verdade que existem problemas derivantes da idade avançada de muitos consagrados e da complexidade da gestão de algumas obras, mas a disponibilidade a Deus levar-nos-á a encontrar soluções.
Pode ser que o discernimento sugira o repensamento de uma obra, que talvez se tenha tornado demasiado grande e complexa, mas então podemos encontrar formas de colaboração com outros institutos ou até transformar a própria obra de maneira que continue, embora segundo outras modalidades, como obra da Igreja. Também por isso, são importantes a comunicação e a colaboração no âmbito dos institutos, com os demais institutos e com a Igreja local. No contexto dos institutos, as várias províncias não podem ser concebidas de maneira autorreferencial, como se cada uma vivesse por si própria, nem os governos gerais podem ignorar as diversas peculiaridades.
A lógica do individualismo pode ofuscar também as nossas comunidades. A tensão entre realidade local e geral, que existe no plano da inculturação do carisma, existe inclusive a nível da economia, mas não deve assustar; deve ser vivida e enfrentada. É mister fazer crescer a comunhão entre os diversos institutos; e também conhecer bem os instrumentos legislativos, jurídicos e financeiros que hoje permitem criar uma rede, encontrar novas respostas, unir as forças, os profissionalismos e as capacidades dos institutos, ao serviço do Reino e da humanidade. É muito importante também dialogar com a Igreja local a fim de que, na medida do possível, os bens eclesiásticos permaneçam bens da Igreja.
Repensar a economia deseja expressar o discernimento que, neste contexto, visa a direção, as finalidades, o significado e as implicações sociais e eclesiais das escolhas financeiras dos institutos de vida consagrada. Um discernimento que começa a partir da avaliação das possibilidades económicas derivantes dos recursos financeiros e pessoais; que conta com a contribuição de especialistas para a utilização de instrumentos não improvisados que permitem uma gestão prudente e um controle sobre a administração; e que age no respeito pelas leis, colocando-se ao serviço de uma ecologia integral. Um discernimento que, sobretudo, se põe contra a corrente porque se serve de dinheiro e não serve o dinheiro per motivo algum, nem sequer pelo mais justo e santo. Em tal caso, seria esterco do diabo, como já diziam os santos Padres.
Repensar a economia exige competências e capacidades específicas, mas é uma dinâmica que diz respeito à vida de todos e de cada um. É uma tarefa que não pode ser delegada a ninguém, mas exige a plena responsabilidade de cada pessoa. Também aqui estamos diante de um desafio educacional, que não pode excluir os consagrados. Sem dúvida, um desafio que em primeiro lugar diz respeito aos tesoureiros e àqueles que estão envolvidos em primeira pessoa nas escolhas do instituto. Deles é exigida a capacidade de ser astutos como as serpentes e simples como as pombas (cf. Mt 10, 16). E a astúcia cristã permite distinguir entre o lobo e a ovelha, porque existem muitos lobos que se disfarçam de ovelhas, principalmente quando há dinheiro em jogo!
Além disso, não podemos deixar de recordar que os próprios institutos de vida consagrada não estão isentos de alguns riscos, indicados na Encíclica Laudato si’: «O princípio da maximização do lucro, que tende a isolar-se de todas as outras considerações, é uma distorção [conceitual] da economia» (n. 195). Ainda hoje, quantos consagrados continuam a pensar que as leis da economia são independentes de todas as considerações éticas? Quantas vezes a avaliação sobre a transformação de uma obra, ou a venda de um imóvel é vista somente com base numa análise do custo-benefício e no valor de mercado? Deus nos livre do espírito de funcionalismo e de cair na armadilha da ganância! Além disso, devemos educar-nos para uma austeridade responsável. Não é suficiente fazer a profissão religiosa para ser pobre. Não é suficiente entrincheirar-se por detrás da afirmação segundo a qual nada possuo porque sou religioso, religiosa, se o meu instituto me permite gerir ou gozar de todos os bens que desejo, e controlar as fundações civis erigidas para manter as próprias obras, evitando deste modo os controles por parte da Igreja. A hipocrisia dos consagrados que vivem como ricos fere a consciência dos fiéis, prejudicando a Igreja.
É necessário começar a partir das pequenas escolhas quotidianas. Cada um está chamado a desempenhar a sua parte, a utilizar os bens para fazer opções solidárias, a cuidar da criação, a medir-se com a pobreza das famílias que certamente vivem ao seu lado. Trata-se de adquirir um habitus, um estilo, no sinal da justiça e da partilha, envidando o esforço — porque muitas vezes seria mais cómodo o contrário — de fazer escolhas de honestidade, conscientes de que é simplesmente aquilo que devíamos fazer (cf. Lc 17, 10).
Irmãos e irmãs, voltam à minha mente dois textos bíblicos que gostaria de deixar à vossa reflexão. Na sua primeira Carta, João escreve: «Quem possuir bens deste mundo e vir o seu irmão sofrer necessidade, mas fechar o seu coração, como pode estar nele o amor de Deus? Meus filhinhos, não amemos com palavras nem com a língua, mas mediante ações e em verdade» (3, 17-18). O segundo texto é muito conhecido. Refiro-me a Mateus 25, 31-46: «Todas as vezes que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim mesmo que o fizestes. [...] Todas as vezes que deixastes de fazer isso a um destes pequeninos, foi a mim que o deixastes de fazer». Voltai a considerar a vossa economia, em fidelidade ao carisma.
Obrigado! Não vos esqueçais de rezar por mim. O Senhor vos abençoe e a Virgem Santa vos proteja!
Vaticano, 25 de novembro de 2016

NB: No nosso site na Rubrica dedicada ao XX CAPÍTULO GERAL encontram o resumo das reflexões feitas por algumas Comunidades sobre a Primeira NEWS LETTER do XX CG. Esperamos outras respostas...